O Fórum das ONG/Aids do Estado de São Paulo, o GIV - Grupo de Incentivo à Vida e a Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids do Estado de São Paulo - RNP+SP enviaram nesta quinta-feira (23/11), carta à direção do Departamento de IST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, sobre a questão do tratamento para Hepatite C no Brasil. Confira a carta abaixo.
São Paulo, 23 de novembro de 2017.
Exma. Sra.
Dra. Adele Benzaken
Diretora
Departamento de IST, AIDS e Hepatites Virais – DIAHV
Ministério da Saúde
Brasília – DF
Prezada Dra. Adele,
No 11º Congresso de HIV/ AIDS e 4º Congresso de Hepatites Virais,
ocorrido de 26 a 29 de setembro de 2017 em Curitiba, o DIAHV anunciou uma nova
estimativa de 0,7% dos casos de Hepatite C que resumimos na Tabela abaixo.
Tabela Estimativa Prevalência de Pessoas com Hepatite C entre 15 e 69
anos (2016)
Prevalência Anticorpos
|
0,7%
|
Total de Infectados
|
1.032.000
|
Prevalência Virêmicos
|
60,7% dos anteriores
|
Casos Virêmicos
|
656.000
|
No mesmo Congresso foram apresentadas estimativas de casos
por estágio da doença, que reproduzimos a seguir:
Estimativa de
Distribuição por Estágio da Doença
|
||
2016
|
2017
|
|
F0
|
116.368
|
108.462
|
F1
|
226.395
|
217.381
|
F2
|
124.731
|
116.793
|
F3
|
112.842
|
110.148
|
F4 (cirrose)
|
69.795
|
69.208
|
Cirrose descompensada
|
3.161
|
3.125
|
Hepato Carcinoma
|
1.685
|
1.643
|
Mortes Relacionadas
|
2.334
|
2.310
|
Totais
|
657.311
|
627.070
|
Também, segundo o Boletim Epidemiológico de Hepatites
Virais 2017 (pág. 21) há entre 2007 e 2016 149.537 casos confirmados com
Hepatite C, dos quais 9,8% correspondem à coinfecção pelo HIV, ou 14.654
pessoas.
Observemos que na notícia divulgada em 27/07/2017, às
vésperas do Dia Mundial das Hepatites, o Ministério da Saúde estimava tratar no
futuro próximo mais 135.000 pacientes com Hepatite C para assim brindar
tratamento para todos. Este número contrasta com a estimativa de prevalência
(656.000 pacientes com necessidade de tratamento) divulgada em Curitiba. Não
podemos concordar com o espírito otimista no comunicado que anuncia como
sucesso o fim da fila para pacientes com F3 e F4, dado que estes pacientes são
pelo menos 180.000 pelas estimativas acima.
A seguinte Tabela mostra os dados de tratamentos com
DAAs, gentilmente fornecidos por esse Departamento e pelo Programa de Hepatites
Virais do Estado de São Paulo.
Local
|
Total
|
Coinfectados HIV-Hep. C
|
Cidade de São Paulo
|
7.185 (18/09/2017)
|
1.031 (18/09/2017)
(14,4%)
|
Estado de São Paulo
|
23.466 (18/09/2017)
|
3.070 (18/09/2017) (13,1%)
|
Brasil
|
57.080 (até o terceiro
trimestre)
|
3.649 (03/07/2017) (6,4%)
|
O DIAHV também informou que a partir do dia 15 de
outubro seriam disponibilizados 25.000 novos tratamentos.
Assim, é claro que a maior parte dos tratamentos para
coinfectados foi fornecida no Estado de São Paulo, numa proporção de mais de
70%, que não corresponde com a proporção populacional do Estado a respeito do
Brasil nem com a proporção das pessoas coinfectadas no Brasil. Isto indica a
necessidade de ações estaduais e municipais para acelerar a cobertura. Com
efeito, há diagnosticados mais de 14.000 casos de coinfectados, quando os
tratamentos acumulados desde outubro de 2015 são menos de 4.000. Desde que
todas estas pessoas devem provavelmente frequentar os serviços de saúde para o
tratamento para HIV, é necessário e possível aumentar rapidamente a quantidade
destes tratamentos.
A proporção de tratamentos para coinfectados
comparados com os monoinfectados por Hepatite C no Brasil e no Estado de São
Paulo também chama a atenção. Esta proporção duplica no Estado e na Cidade de
São Paulo a respeito do Brasil, passando para 41% do total. Isto é
surpreendente desde que o tratamento para monoinfectados depende de exames de
fibroscan, não disponíveis em todos os serviços de saúde, diferentemente do
tratamento para coinfectados. Saliente-se que o diagnóstico da hepatite C é
fundamentalmente uma atribuição de Estados e Municípios.
O governo brasileiro paga preços muito altos pelos
medicamentos, o que se traduz em restrição de tratamento, optando por exemplo
pelas Fibroses ou algum outro. Já outros países em desenvolvimento oferecem
tratamento universal para a Hepatite C. Com efeito, o Egito tratou já mais de
1,4 milhões de pessoas pagando na atualidade um preço inferior a U$ 180 por
tratamento. A Malásia decretou o licenciamento compulsório para uso
governamental e provavelmente pagará menos de U$ 300 por tratamento.
Portanto, solicitamos desse Ministério que:
1.
Intervenha junto a Estados e Municípios
para que as pessoas coinfectadas com Hepatite C e HIV sejam tratadas;
2.
Encabece campanhas de
diagnóstico para localizar e tratar as pessoas com estágios F2 e mais
avançados;
3.
Obtenha preços mais
vantajosos, como tantos outros países em desenvolvimento, para tratar as
pessoas com Hepatite C, usando as salvaguardas estabelecidas na nossa Lei 9279
de patentes e no Acordo ADPIC;
4.
Se abstenha de divulgar
notícias ufanistas como “zerar filas”, quando na verdade o que está acontecendo
é o fracasso do diagnóstico e acesso à assistência, e convoque os brasileiros a
se testarem para a Hepatite C.
Cordialmente,
Rodrigo Pinheiro Claudio
Pereira Paulo
Giacomini
FOAESP GIV RNP+SP